1º de Dezembro

 

RESTAURAÇÃO  

TEATRO DE FANTOCHES

 

CENA 1 – REVOLTA da MEIA-ANATA – SANTARÉM 1629

 

O governo de Madrid lançou a “meia-anata”, imposto pelo qual todos os não eclesiásticos que exercessem cargos públicos tinham de pagar metade do que recebiam anualmente.

ALMOCREVE – Chego agora de Lisboa….Os fidalgos patriotas dizem que o Duque de Olivares precisa de 500.000 cruzados para comprar armas para combater “os protestantes europeus”.

TRAIDORA – Olha que eu não estou descontente com o governo castelhano. Assim fazemos parte de um grandioso país.

AGUADEIRO (virando-se furioso para a traidora) – O’ vossemecê! que é que está pr’ai a dizer (virando-se para o público) À fogueira com ela!

ALMOCREVE – O’ traidora! Então acha bem que metade do nosso dinheirinho vá para comprar armas? A guerra religiosa está a fazer-se à custa dos impostos de Portugal e da Catalunha…Isso está certo?

TRAIDORA – (um pouco aflita) Está um bocado certo… meio certo…

TIPOGRAFO – Espere-lhe pela volta e verá: o que você está a dizer será publicado amanhã no meu jornal.

TRAIDORA – Quer dizer… já não sei bem o que digo …

AGUADEIRO – Então explique-se, mulher!

TRAIDORA – Bem, isto tudo deixou-me muito confusa… tenho que descansar…

AGUADEIRO – Arrede-se, traidora! Vá descansar as ideias e não envenene o nosso patriotismo….(para o tipógrafo) – Sr. Tipógrafo, … sabe que eu também ando a ficar com as ideias baralhadas?! …explique-me lá o que é esse novo imposto de que andam pr´ai a falar.

(a traidora sai de cena)

TIPOGRAFO – A partir de amanhã vamos ter de pagar o imposto da “MEIA-ANATA”: metade do que ganharmos durante o ano será mandado para o Olivares. (para o público) – Só esses clericais, almas do demónio, estão livres da “meia-anata”. Pudera o rei Filipe quer o apoio dos padres e por isso não lhes cobra impostos.

AGUADEIRO – (levando as mãos à cabeça) – Ai valha-me Deus!... Como é que eu posso sustentar a minha família? Já recebo tão pouco por acarretar água… se pagar a meia-anata o que vai ser de mim? (para o público) Olhem, os padres é que deviam pagar…não têm família para sustentar e a guerra, que eu saiba, é para defender a religião.

ALMOCREVE – Os espanhóis o que é que pensam que os portugueses são? O cofre-forte de Espanha? Não daremos nem mais um cruzado furado para Espanha!

TIPOGRAFO – Eu, dos espanhóis, só gosto das andaluzas… Olé! Só dou dinheiro para as ver dançar, …. Agora, impostos … não pago!

TODOS – Não pagamos a “meia-anata”! Não pagamos a “meia-anata”

 

 

CENA 2 – MOTIM COM MAÇAROCAS – PORTO 1635

 

Um grupo de regateiras e marujos correm a cidade numa gritaria contra os novos impostos. O imposto que mais revolta os portuenses é o “real de água”. Vão armados com rocas e maçarocas, como tinham feito na revolta de 1628.

MARUJO1 – O rio Douro é nosso!

REGATEIRA – Sempre nos deu ÁGUA de graça!

MARUJO2 (bêbado cambaleando e soluçando) – Hips! … Água?... Imposto?... Eu não pago… só funciono a vinho… Hips!

MARUJO1 – O rei Filipe meteu-se nas guerras da Europa e nós é que temos que pagar!

REGATEIRA – O rei por ele não se metia….o ministro Olivares é que quer a guerra porque é um ganancioso. Morra o Olivares que é um TIRANO!

MARUJO1 – O espanhol que manda cá no Porto, tem de se ver connosco!

REGATEIRA – ( com uma roca maçaroca na mão ) – Vamos dar cabo dele. Ele que não julgue que nos cobra mais impostos! Em 1628, no terreiro de S. Domingos, já demos com as maçarocas na cabeça dos cobradores de impostos e agora damos outra vez….

MARUJO2 (bêbado) – Hips! Ora… se já se viu … pagar o Real de Água!... Hips!... era o que faltava!

TODOS – NÃO PAGAMOS O REAL DE ÁGUA! NÃO PAGAMOS O REAL DE ÁGUA!....

SECRETÁRIO – (aparece aflito, tentando acalmar os revoltosos, o secretário do governo Espanhol) – Calma!... Yo explico…

REGATEIRA – Ó espanholito duma figa, da minha algibeira não levas nem MEIO REAL!

MARUJO1 – Eu é que te vou explicar….(pega numa roca “maçaroca” para o agredir)

REGATEIRA – ( dando com a roca “maçaroca” na cabeça do Secretário ) – TOMA, TOMA lá o real de água!

O secretário foge

TODOS – (correndo atrás dele para o agredir ) – Toma lá, ó Castelhano! Toma lá ladrão!

 

CENA 3 – COCHICHOS DIPLOMÁTICOS – LISBOA 1635

 

Um joalheiro francês, Broual, mensageiro secreto do Cardeal Richelieu, inimigo de Espanha, vem a Portugal, oferecer apoio militar aos portugueses, que se querem libertar do domínio Filipino. Vai a casa do patriota D. João Pinto Ribeiro com o pretexto de lhe levar a encomenda de uns brincos para o fidalgo oferecer à esposa.

JOALHEIRO BROUAL – Trrruz! Trrruz! Trrruz!

CRIADO MOURO – Que deseja Vossa Senhoria?

JOALHEIRO – Vai chamarrr o teu patrrrão porrrque tenho uns brrrincos de esmerrraldas que ele

 prrróprrrio encomendou parrra oferrrecerrr à sua esposa.

CRIADO MOURO – Mim ir chamar meu amo, Sr. D. João Pinto Ribeiro

D. JOÃO P. R. – Benvindo sejais a esta casa portuguesa. (para o criado ). Diz na cozinha que preparem um cozido à portuguesa para homenagear esta nossa visita.

CRIADO MOURO – Calhar bem, Sr. D. João, ter havido boa matança de porco.

JOALHEIRO – Trrrago muitas novidades, D. João Rrribeirrro …

D. JOÃO P.R. –Tendes aí a mensagem secreta de sua Eminência o Cardeal Richelieu?

JOALHEIRO – Está aqui dentrrro (aponta a caixa dos brincos). Serrrá que não há perrrigo de nos ouvirrrem?

D. JOÃO P.R. – Falai à vontade. Estamos sós.

JOALHEIRO – Obserrrvai bem o fundo desta caixa de brrrincos.

D. JOÃO P.R. – (abre a caixa onde se veem uns brincos, remexe e retira um papel) Lede bem alto e contai quais os apoios que os portugueses patriotas terão de sua Eminência, Cardeal de França.

JOALHEIRO – (lendo) “ Eu Rrrichelieu, prrrimeirrro ministrrro de sua majestade Luís XIII de Frrrança, prrrometo enviarrr ao Porrrtugal rrrevoltado contrrra o domínio espanhol os seguintes apoios: 10.000 homens de Infantarrria, 500 homens de Cavalarrria, outrrros 500 equipados parrra montarrr e uma arrrmada de 50 barrrcos de guerrrra. Esta prrromessa tem uma condição: Os Porrrtugueses deixarrrem de obedecerrr ao rrrei de Espanha.”

D. JOÃO P.R. – Contam-se pelos dedos das mãos os portugueses fíeis ao rei Filipe. A guerra da Independência já começou no Porto, em Santarém e noutras terras de Portugal. Precisamos de a acabar. Dizei a sua Eminência que contaremos com o apoio militar prometido o mais depressa possível, pois o nosso patriotismo já se impacienta.

 

 

CENA 4 – REVOLTAS DO MANUELINHO  – ÉVORA 1637

 

O “Manuelinho” era uma espécie de gigante doido que errava pelas ruas de Évora, fazendo discursos contra o domínio castelhano e contra os impostos. Provocou tumultos tão graves, que a Duquesa de Mântua se deslocou a Évora para tentar acalmar os ânimos.

MANUELINHO – Morram os que pagam os impostos ao rei Faraó! Filipe V é um tirano!

PASTORA ALENTEJANA – Ó gigante enorme tem cuidado que vem aí a Duquesa de Mântua.

MANUELINHO – Ela que venha não tenho medo…

(chega a duquesa )

DUQUESA – Escuchad mis palabras. Não dareis oidos a esse tonto enorme….

MANUELINHO – Olhem uma governanta de Portugal que nem sabe falar português. Cala a tua voz que é fina demais… Já agora podias chamar o Miguel de Vasconcelos para ver se ele mete mais medo do que tu…sempre tem voz de homem…

DUQUESA – (fingindo que não ouvira as irreverências do doido) – Ay de los que escuchem lo que dice este enfermo mental! Si lo escuchais, yo os condanaré a la horca o à las galés.

MANUELINHO – Que galés? As únicas galés que tínhamos estão a fazer companhia às sardinhas mortas, foram afundadas pelo Drake e pelos Holandeses.

DUQUESA – (mais uma vez fingindo não ouvir) – No volveré atrás com mi palabra. No mi gusta hablar dos veces.

MANUELINHO –  Ah! Ah! Ah!

 

CENA5 – CONSPIRAÇÃO DA NOBREZA  – LISBOA Agosto 1640

 

A Catalunha tinha-se revoltado contra o domínio de Madrid. Miguel de Vasconcelos ordena aos nobres portugueses que partam imediatamente para ajudarem o Duque de Olivares a abafar a revolta catalã. Um grupo de nobres em casa de D. Antão de Almada, reúne-se em conspiração.

D. ANTÃO de ALMADA – Temos de tomar urgentemente uma atitude

D. MIGUEL de ALMEIDA – Então o que há de novo?

D. ANTÃO de ALMADA – O ministro Miguel de Vasconcelos obriga todos os fidalgos portugueses a partirem rapidamente para a Catalunha que se revoltou contra o domínio espanhol.

D. JERONIMO – Eu recuso-me a lutar contra os catalães, porque eles querem a independência tal como nós.

D. MIGUEL de ALMEIDA – És um jovem como deve ser. Eu sou um velho de 80 anos, mas pegarei em armas e lutarei, não em Espanha contra a Catalunha, mas em Lisboa contra os espanhóis.

D. JERONIMO – Minha mãe, D. Filipa de Vilhena, me armará cavaleiro para eu poder lutar contra Miguel de Vasconcelos e contra a Duquesa de Mântua.

D. FRANCISCO – Eu também defenderei a independência de Portugal com a espada com que minha mãe, D. Filipa de Vilhena, me armar.

D. MIGUEL de ALMEIDA – Abençoada mãe que deu ao mundo uns jovens tão patriotas!

D. ANTÃO de ALMADA – Nós temos que nos revoltar. Se não houver rei, derrubaremos o governo espanhol e formaremos uma república.

D. JOÃO PINTO RIBEIRO – Amanhã mesmo, estarei em Vila Viçosa e perguntarei a D. João, Duque de Bragança, se aceita a coroa portuguesa

 

CENA 6 – MONARQUIA OU REPUBLICA  – VILA VIÇOSA 1640

 

D. João Pinto Ribeiro chega ao palácio de Vila Viçosa onde se encontra o Duque de Bragança e sua esposa, D. Luísa de Gusmão.

D. JOÃO PINTO RIBEIRO – Bons dias! Tenho uma boa nova para vos contar.

D. JOÃO, DUQUE de BRAGANÇA – Contai-me, contai-me. Estou curioso.

D. JOÃO PINTO RIBEIRO – Nós, os fidalgos de Lisboa, planeámos um assalto ao palácio da Duquesa de Mântua. Expulsaremos essa espanhola insonsa e o seu secretário. (pausa) Mas temos de ter um rei. Aceitais a Coroa Portuguesa?

D. JOÃO, DUQUE de BRAGANÇA – Estarei ao lado dos Portugueses, mas terei de consultar a minha esposa, D. Luísa de Gusmão.

D. JOÃO PINTO RIBEIRO – Caso não aceitardes o título de Rei, implantaremos uma República, custe o que custar… nem que a nossa vida corra perigo.

(D. João, Duque de Bragança, toca uma sineta e aparece um criado)

CRIADO – Excelência? Estou ao Vosso dispor.

D. JOÃO, DUQUE de BRAGANÇA – Chama a Senhora, D. Luísa de Gusmão.

CRIADO – Sua Excelência parece que adivinhava…. está aí a chegar.

D. JOÃO PINTO RIBEIRO – (dirigindo-se a D. Luísa e beijando-lhe a mão) Excelência, é uma honra cumprimentá-la.

D. JOÃO, DUQUE de BRAGANÇA – (virado para a mulher e apontando-lhe D. João Pinto Ribeiro) O amigo João Pinto Ribeiro veio para me perguntar se eu aceitava a Coroa Portuguesa… Nada lhe respondi sem ouvir a minha mulher e conselheira.

D. LUÍSA de GUSMÃO – Claro, senhor meu marido… Mais vale ser rainha por uma hora que duquesa toda a vida.

D. JOÃO PINTO RIBEIRO – Portugal ficará muito contente com as vossas decisões. No dia 1º de Dezembro, logo pela manhã, o nosso assalto ao Palácio Real dar-nos-á a glória.

Sociedade Histórica da Independência de Portugal (SHIP)

 

Sinopse Peça de Fantoches

PEÇA DE FANTOCHES

(Escola Preparatória de Maria Lamas na Travessa da Prelada 4200 Porto é um trabalho colectivo de míudos dos 12 aos 15)

 

1ª cena – Revolta da meia-anata Santarém - 1629

Almocreve, Traidora, Aguadeiro, Tipógrafo, - 4 personagens

 

2ª cena – Outro motim com maçarocas – Porto – 1635

Marujo1, Marujo2, regateira, secretário 4 personagens

 

3ª cena – Cochichos diplomáticos – Lisboa – 1635

Joalheiro Broual, Criado mouro, D. João Ribeiro 3 personagens

 

4ª cena – Revoltas do Manuelinho – Évora - 1637

Manuelinho, Pastora alentejana, Duquesa de Mântua 3 personagens

 

5ª cena – Conspiração da nobreza – Lisboa – Agosto 1640

D. Antão de Almada, D. Miguel de Almeida, D. Jerónimo, D. Francisco ( filho de Filipa de Vilhena), D. João Pinto Ribeiro 5 personagens

 

6ª cena – Monarquia ou Républica? Vila Viçosa – 1640…

D. João Pinto Ribeiro, D. João Duque de Bragança, criado 3 personagens

 

7ª cena – Assalto ao Palácio – Lisboa 1 de Dezembro de 1640

Mendiga, D. João Pinto Ribeiro, D. Jerónimo, Escrava, Miguel de Vasconcelos, Mouro, D. Miguel de Almeida, Duquesa de Mântua, Nobre, Mordomo da Duquesa 10 personagens

 

8ª cena – Cerimónia da Coroação – Lisboa 15 de Dezembro de 1640

Bispo, D. João IV duque de Bragança … 2 personagens